Introdução

Nas últimas décadas, esforços têm sido realizados em vários países, no sentido de definir e avaliar intervenções pautadas pelo modelo Recovery, ao qual nos referiremos neste texto também como Superação. O processo de Superação se constitui na busca de se viver uma vida significativa, qualquer que seja a condição física, mental ou social, alicerçada na relação entre a pessoa, seus pares (outras pessoas que enfrentam os mesmos tipos de problemas, às quais nos referimos neste texto como pessoas com experiência vivida – PEV), suas redes de apoios formais e informais, e seu contexto cultural, fatores que podem facilitar ou dificultar esse processo (Thériault et al., 2020). 

Aspectos relativos ao processo de Superação têm sido adotados, internacionalmente, como o foco principal dos serviços de saúde mental e indicadores das boas práticas desses serviços. Como consequência deste movimento, a Organização Mundial de Saúde (OMS), desde 2012, tem recomendado o Recovery como base para a orientação dos serviços de saúde mental ao redor do mundo (World Health Organization, 2021a; 2021b). 

Entre as principais intervenções orientadas ao processo de Superação, tem se destacado nas últimas décadas a proposta dos Recovery Colleges, Estes consistem em serviços de base educacional nos quais seus usuários são estudantes baseados nos modelos de educação para adultos e focados na promoção da cidadania e do empoderamento por meio, principalmente, da co-produção e dos processos de ensino- aprendizagem (Hayes et al., 2023). 

Nos Recovery Colleges, os participantes, independentemente de suas condições, diagnósticos ou posições dentro da estrutura, são vistos como estudantes. Esses serviços oferecem vários cursos, oficinas, eventos e outros produtos que se adaptam às necessidades específicas desses estudantes, capacitando-os com novas habilidades que podem promover a Superação em vários aspectos. São exemplos dos produtos oferecidos, cursos, oficinas e eventos voltados ao manejo de saúde, bem-estar e

doenças, artes, cultura, capacitações e outras atividades promotoras de habilidades para a vida cotidiana, emprego e cidadania. 

Os Recovery Colleges devem envolver pessoas em seu próprio processo de Superação, seus pares, profissionais e, quando pertinente, outros atores sociais, em todos os aspectos do programa (Thériault et al., 2020; Whitley et al., 2019). Em geral, existe um alto nível de satisfação dos estudantes com os Recovery Colleges. Além disso, eles têm sido associados a uma significativa redução de custos e à utilização dos serviços de saúde mental, bem como uma diminuição de internações e mudanças na prática dos prestadores de serviços (Hayes et al., 2023). 

Em junho de 2024 registrava-se a existência oficial de 221 Recovery Colleges no mundo. Apesar da disseminação destes serviços, particularmente em alguns países, como o Reino Unido, ainda não existe nenhum programa desenvolvido na América Latina (Hayes et al., 2023). 

Apesar de o processo de Superação não estar ainda formalmente incluído nas políticas de assistência à saúde mental no Brasil, acreditamos, seguindo a tendência internacional (World Health Organization, 2021a; 2021b) e de acordo com diversos autores brasileiros (Costa, 2017; Oliveira, 2017; Corradi-Webster et al., 2023), que esta abordagem pode contribuir de forma extremamente positiva para o aperfeiçoamento dos sistemas de saúde, inclusive da assistência de saúde mental e os ligados à assistência e desenvolvimento social, e ao sistema judiciário, entre outros. Portanto, propõe-se o presente projeto, focado no desenvolvimento e testagem do primeiro Recovery College no Brasil, denominado como Imagus – Escola de Superação e Cidadania (ESC). 

Rolar para cima